31 janeiro, 2012

Gostaria que ela voltasse.

Mais uma vez me surpreendo com este autor. Dei por mim a querer ler mais deste bonito lugar construído pelo Gonçalo e o deslumbramento aumenta em cada página lida. De tempos a tempos há encantos que nos deixam simplesmente a planar sobre a terra. Ler tem destas coisas: faz-nos voar!

Gostaria que ela voltasse.
Quando ela está eu sofro muito,
mas também danço muito.
Sofro 50 e danço 150.
Fico a ganhar 100 de dança.
Por isso é que quero que ela volte.

As mulheres são bonitas, mas ela ainda é mais bonita
que as mulheres.
Tem pés de bailarina mesmo quando está sentada.
E é muito difícil ter-se pés de bailarina quando
se está sentada.
Quando ela dorme parece que todo o quarto dorme.
É como se a própria cama dormisse.
É como se os móveis e os lençóis dormissem.
As paredes dormem.
As portas dormem.
As janelas dormem. Tudo dorme.
Por isso é que eu gosto tanto dela.
Gosto de olhar as coisas quando elas dormem.

Quando ela adormece, adormece o mundo e aí eu aproveito
para viajar.
Gosto de viajar quando mundo dorme
Porque assim consigo ver as coisas a respirarem naturalmente.
Só se é natural quando se dorme.
Quem acorda, acorda os instintos de sobrevivência.
É melhor andar por cima da terra quando ela dorme,
do que quando ela quer sobreviver.

Quando a Natureza dorme podemos correr à vontade pois
será impossível tropeçarmos, será impossível sermos lentos
ou demasiado rápidos.
O nosso ritmo é o certo.
Tudo vive nos seu sítio e nós observamos, acordados,
as coisas do alto.

É por isso que eu gosto dela. Dessa mulher.
É por isso que eu gostaria que ela voltasse.
Ela adormece o mundo para eu passar
e só quando eu estou em total segurança é que ela acorda.
É estranho: ela protege-me quando dorme.
Protege-me quando dorme.

Gonçalo M. Tavares

in O homem ou é tonto ou é mulher.




Alice e  as viagens